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A incapacidade para estarem sozinhas (e caladas)
Este artigo de
Henrique Raposo (www.expresso.pt) está interessante:
É oficial: não vou mais ao cinema. Já não é possível ir ao cinema sem sair de lá com uma irritação & dor de garganta.
As pessoas já não conseguem ficar caladas durante duas horas. Têm um
duende, algures no ombro, a dizer "tens de falar, tens de conversar,
fala, conversa, dá uma piada, fala, dá uma risada parva, fala outra vez,
ai que bom". E já não estamos a falar apenas de adolescentes. Ontem, um
grupo de trintonas achava que podia transformar a fila F num café de
bairro. Fui obrigado a explicar-lhes que, com certeza, podíamos bater um
papinho, não me importava, mas só depois do filme acabar, o café é lá
fora, meus amores. Acreditam que ficaram ofendidas? Depois, ao meu lado,
uma senhora de idade começou a explicar o filme ao neto. Eu tentei
explicar-lhe que existe uma linha na areia entre a casa dela e o cinema público,
e que, por isso, ela tinha de estar caladinha. Acreditam que ficou
ofendida? Eu, o tipo que estava calado, é que estava a ser mal-educado.
É oficial: a nuvem (telemóveis & net) anda a dizimar a inteligência e o bom senso da malta.
De forma generalizada, as pessoas estão a perder a capacidade para
estarem sozinhas e caladas. E não é só no cinema. É em todo o lado. Uma
pessoa vai ao restaurante e parece entra num big brother. O "Francisco"
chega 5 minutos antes da "Joana". Acham que ele consegue ficar sozinho e
calado nesses 5 minutos a olhar, sei lá, para a ementa? Claro que não:
pega de imediato no telemóvel. No processo, todas as pessoas num raio de
10 metros ficam a saber que o "Francisco" e a "Joana" têm problemas na
cama. Caro "Francisco", era escusado, não? E esta telenovela mexicana
repete-se em todo o lado. No café, na frutaria, na fila do Pingo Doce,
nos correios. Uma ida à rua passou a ser uma ida à intimidade do "Francisco", da "Joana", do "Marco", da "Dona Laurinda". Caramba, calem-se um pouco.
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